Com o aumento da expectativa e da qualidade de vida da população mundial, pessoas acima de 60 anos estão reavaliando como querem viver depois de aposentadas, filhos crescidos, estabilidade econômica e disponibilidade de tempo.
Se nas gerações anteriores o conceito de envelhecer estava associado à aposentaria e atenção à casa e família, agora uma nova porta se abre rumo a outras possibilidades. Acima de tudo, são cidadãos com mais idade e mais bagagem, e que estão dispostos a construir novos significados para esta fase da vida. Sem aceitar mais o rótulo de “idoso” ou “terceira idade”.

Lifelong learning 1f3s5y
Para Ana Paula Sohn, 47 anos, coordenadora do curso superior de extensão Universidade da Criativa Idade, desenvolvido pela Univali, essa geração é revolucionária, pois os aposentados não querem mais ficar isolados, e sim continuar ativos e participativos socialmente.
“Mais do que nunca, há um grande contingente de pessoas interessantes e experientes que desejam voltar para as universidades”, afirma Ana.
É nesse cenário que surge o termo lifelong learning, ou seja, aprendizagem ao longo da vida, que pontua a necessidade de os indivíduos se manterem constantemente estudando e se desenvolvendo.
O conceito parte do princípio de que o modelo tradicional de educação
perpetuado ao longo do século 20 já não é suficiente para preparar as pessoas, mantê-las atualizadas, competitivas e produtivas.

Além da perspectiva laboral, existe também a perspectiva pessoal. Para muitos especialistas, à medida que se para de aprender, perde-se a
motivação de viver, o que leva muitas pessoas à depressão. “Percebo que nossas alunas incorporam a cada aula que viver é estar sempre aprendendo e criando,” ressalta a coordenadora do curso de extensão.
Como nunca antes na história, os costumes, os processos de trabalho, de aprendizagem e até as relações pessoais estão se transformando em um ritmo acelerado. Por isso, a capacidade de aprender constantemente até o final da vida é fundamental.
Mais jovens por mais tempo 4p3852
Para o psicanalista doutor em Literatura e Ciências Humanas Daniel Correa Felix de Campos, 53 anos, “viver é um constante aprendizado, por isso voltar a estudar depois dos 60 anos é de suma importância para poder reelaborar novos saberes, novas trocas e novos sentidos”, avalia.
Daniel conta que, na sua experiência clínica, as mulheres em geral estão mais dispostas social e culturalmente para se reinventar ao longo da vida.

De acordo com o psicanalista, que é também professor do curso Universidade da Criativa Idade, sua ideia a respeito das alunas com
mais idade é que “elas são mais jovens por mais tempo”.
O professor conta que gosta muito de ensinar sobre a vida e a obra de Frida Kahlo, artista surrealista mexicana que é um ícone da arte contemporânea apesar de ter a vida marcada por inúmeras tragédias.
“Mesmo com inúmeros problemas e em cima de uma cama, Frida nunca parou de criar as suas obras, por isso, para mim, ela é a representação da perseverança e da resiliência”, destaca Daniel.
Paixões são tema de aulas 4y275r
Para Evandro da Rocha Gaspar, 52 anos, arquiteto e urbanista, e também professor do curso, adultos com mais experiência, quando voltam a estudar, têm uma participação e uma curiosidade maiores do que muitos alunos jovens.
O arquiteto é apaixonado por viagem, cultura, arte, história e beleza, e são esses os temas que predominam em suas aulas. O professor conta que, durante o período das aulas presenciais anterior à pandemia, ele e as alunas do curso visitavam os centros históricos e artísticos da Capital, e tinham a pretensão de um dia fazer uma viagem de estudos ao exterior.
Evandro destaca que o prazer do conhecimento é o tempero da vida e que todo final de semestre as alunas do curso apresentam trabalhos que revelam a criatividade e o envolvimento da turma com o conteúdo
ensinado nas aulas.
“Costumo escolher a cada curso cinco museus do mundo e duas obras de
cada um deles, e assim ensinar sobre as diferentes escolas de arte, a vida de seus artistas e o contexto da obra selecionada”, explica.
Durante a pandemia, as aulas são online e, segundo ele, cada vez mais as alunas estão engajadas com o novo formato.
“A Covid-19 potencializou o interesse do público para o aprendizado no meio virtual, e pelo visto é um fenômeno que não tem mais volta. As pessoas que envelhecem de forma saudável têm buscado aprender sobre
novas áreas do conhecimento e participar ativamente dos temas da atualidade”, afirma.
Da matemática à psicanálise 3c476o
Ana Maria Albertina Schmitz Bonin, de 71 anos, começou o curso de extensão online e já está matriculada para o novo semestre. Albertina é professora aposentada, formada em Matemática e mestre em istração de Empresas, tendo trabalhado durante 20 anos na
Univali.

A convite da coordenadora Ana Paula, decidiu entrar para o curso Universidade da Criativa Idade e está adorando. “Sempre trabalhei na área de Exatas, e o meu mundo era muito marcado pelo racional. Apesar de ter o hábito de viajar e de frequentar museus, não conhecia a fundo o universo das artes e da psicanálise, inclusive tenho planos de voltar a
muitos desses lugares para rever as obras, pois é um mundo encantador e novo que se abriu para mim e ampliou o meu horizonte”, revela.
Antes da pandemia, Albertina estava com a agem já comprada para a Europa e precisou mudar os seus planos. Uma das alternativas para lidar com o tempo ocioso foi voltar a estudar.
“Mesmo que o curso seja online, toda terça-feira à tarde eu me arrumo como se fosse para um evento social, com o objetivo de estar conectada às minhas amigas da universidade”, conta.
Autoestima e reflexões sobre o envelhecimento 6e4o1m
A servidora pública aposentada Regina Vieira, de 71 anos, também aluna do curso, é da mesma opinião: “Nunca me imaginei estudando fotografia, e aprender sobre como compor uma boa foto expandiu minha visão de
mundo e ainda me permitiu conhecer novas pessoas”.
A professora aposentada Tânia Costa, de 68 anos, está no curso desde 2017, quando era presencial, e agora continua na versão online. Segundo ela, ao atingir certa idade, as pessoas se sentem excluídas socialmente e fora do mercado de trabalho.

“Esse curso nos dá a oportunidade de conviver com pessoas de gerações diferentes e aumenta a minha autoestima e a motivação, pois minhas colegas de turma são instruídas, viajadas e cultas. É uma troca de
experiência de vida incrível”.
Tânia conta também que o círculo de amizades se expandiu para
a sua família, pois ela e o marido ficaram amigos de outros casais do curso. A aposentada pontua que “refletir sobre o processo de envelhecimento é imprescindível e que investir em novos conhecimentos é como voltar a ser uma jovem estudante em banco escolar”, avalia.
Pesquisar e estudar sobre diferentes temas, como a moda e seus estilistas, por exemplo, são ações que têm aumentado muito a sua bagagem cultural. “A gente é que faz a vida ser feliz, por isso não se deve aposentar da vida”, conclui.
Juntos na vida e na volta aos estudos 1d165y
Segundo instituições internacionais, no papel da aprendizagem a distância – principalmente no nível superior e na educação de adultos –, o processo de formação ao longo da vida é também de inclusão social e de valorização pessoal e profissional do cidadão.
A advogada Ondina Berndt, de 78 anos, é um exemplo que mostra a importância de voltar a estudar. Aos 55 anos, Ondina se aposentou como funcionária da Justiça do Trabalho e resolveu fazer uma especialização em Direito de Família para poder atuar como advogada, tendo exercido a
profissão por 20 anos.
“Quando me aposentei, pensei que assistir a filmes, ler livros e viajar
seria suficiente, mas isso não preencheu todas as minhas necessidades, motivo pelo qual voltei a trabalhar”.

O marido dela, Waldir Berndt, de 81 anos, professor de Filosofia aposentado da Udesc, assim que se jubilou, há décadas, também voltou a estudar e ingressou no curso de Direito, e juntos atuaram no mesmo escritório de advocacia.
Atualmente, o casal de advogados se aposentou da área jurídica, mas Ondina ainda cuida, em casa, de alguns processos remanescentes, pois agora quase todos são virtuais.
Ao final da entrevista, Ondina deixa uma mensagem:
“O que gostaria de dizer às pessoas acima de 60 anos é que precisam encarar a vida como jovens, pois ainda têm a capacidade e a possibilidade de amar e de serem amadas, em todas as dimensões do amor. Além disso, se tiverem que recomeçar a vida e de fato desejarem esse recomeço, terão condições plenas de fazê-lo, podendo estudar e trabalhar, ou ambos, o que irá preencher a sua vida de maneira positiva, além de, com a experiência adquirida no decorrer dos anos, continuar a ser útil à
sociedade”