Um estudo publicado pelo portal Repórter Brasil, em parceria com a OIT (Organização Internacional do Trabalho), constatou que entre os anos de 2003 e 2018, apenas 5% dos casos de exploração do trabalho se referem às mulheres. Foram 35.943 trabalhadores resgatados em situação análoga à escravidão no Brasil. Nos registros, só 1.889 eram mulheres, conforme mostra o repórter Guilherme Padin, do portal R7.

Entre os dados destacados, segundo a Detrae (Divisão de Fiscalização para a Erradicação do Trabalho Escravo), ligada à Subsecretaria de Inspeção do Trabalho, de todos os resgates feitos no ano de 2021, apenas 10% eram de mulheres em situação de exploração.
Para a coordenadora nacional de Erradicação do Trabalho Escravo e Enfrentamento ao Tráfico de Pessoas do MPT (Ministério Público do Trabalho), Lys Sobral Cardoso, os casos femininos são mais escondidos, uma vez que a situação é mais aceita na sociedade.
“O trabalho doméstico, por exemplo, é um trabalho que todos conhecem, mas sua superexploração acaba sendo aceita na sociedade”, explica.
Sobral ainda conta que, embora haja mais homens resgatados em situação de escravidão, o percentual que varia entre 5% e 10% de mulheres em condições análogas à escravidão, não representa a realidade. A coordenadora destaca que há três principais casos de exploração, sendo o tráfico de pessoas, o trabalho escravo doméstico e a exploração sexual.
Formas de exploração no Brasil 3c4ic
Segundo a ONU (Organização das Nações Unidas), aproximadamente 70% das vítimas de tráfico de pessoas são mulheres. No entanto, no Brasil, o crime não é considerado forma de escravidão. Para Sobral, isso mostra que dados e informações estão desagregados nos órgãos trabalhistas, sendo indício da subnotificação de casos no país.
Na sequência, o trabalho doméstico, que direciona mulheres aos afazeres da casa, deixa mulheres em situação de superexploração dessa atividade. Como a vítima vive apenas com a família para a qual trabalha, não há apoio dos próprios familiares, nem possuem recursos financeiros para sair da situação.
Por último, a exploração sexual, embasada no trabalho sexual, que não é atividade proibida, tem como maior dificuldade o reconhecimento da superexploração. Assim como no caso do trabalho doméstico, o enfrentamento da exploração sexual é delicado, considera Lys.
“Enfrentamos muitos desafios na esfera do trabalho para reconhecer direitos, garantir carteira de trabalho e remuneração àquela pessoa”, ressalta.
Números e casos 4s5m4y
Entre as quase duas mil mulheres resgatadas entre 2003 e 2018, nenhum dos três principais casos aparece na lista.
Cerca de 71,3% eram trabalhadoras rurais, 8,1% atuavam como cozinheiras, 7,8% como costureiras, 2,5% eram operadoras no processo de moagem e 1,3% carvoeiras. Os 8,9% restantes se encaixavam em outras formas de trabalho escravo.
Das 770 mulheres resgatadas que informaram raça, 11% eram pretas, 42% pardas, 25% brancas, 20% amarelas e 2% indígenas. Do total, quase dois terços (62%) não haviam concluído o ensino fundamental. As faixas etárias predominantes eram de 30 a 39 anos, representando 32,6%.
Em janeiro deste ano, uma mulher foi resgatada em uma residência de Campina Grande, na Paraíba, onde foi empregada doméstica por 39 anos. Além de trabalhar sob pressão psicológica, ela era submetida a jornadas exaustivas em um ambiente degradante e insalubre, segundo o MPT.
Desde 2017, sua carga de trabalho aumentou para mais de 17 horas diárias. Trabalhando também aos sábados e domingos, ela cuidava dos 100 cães adotados pelos patrões, monitorando alimentação dos animais, limpeza de fezes e os locais de abrigo.
Em Campo Bom (RS), a 3,8 mil quilômetros de Campina Grande, uma mulher de 55 anos com deficiência intelectual, que trabalhou como doméstica desde os 15 anos, foi resgatada em fevereiro.
Ela não possuía vínculo de emprego reconhecido nem limitação de sua jornada de trabalho diária ou semanal, e era impedida de conviver com a própria família, além de sofrer agressões físicas e morais e não poder conversar com pessoas estranhas à família dos patrões.
O caso só chegou ao conhecimento do MPT devido às denúncias de vizinhos, que presenciaram agressões, ofensas e ameaças à vítima.
Casos de trabalho escravo e como denunciar 561266
- Trabalho forçado (indivíduo submetido à exploração, sem poder deixar o local por causa de dívidas ou ameaças);
- Jornada exaustiva (horas diárias ou dias por semana desgastantes, que ponham em risco a saúde);
- Servidão por dívida (trabalho por dívidas ilegais que “prendam” o trabalhador à atividade);
- Condições degradantes (elementos que indiquem a precariedade do trabalho, como alojamento precário, alimentação de baixa qualidade, maus-tratos, ausência de assistência médica, saneamento básico e água potável).
A denúncia de um caso de trabalho escravo pode ser feita por meio do Disque 100. A notificação do Ministério Público do Trabalho pode ser feita pelo MPT Pardal, aplicativo disponível nos sistemas Android e iOS. A Detrae, divisão do governo federal, recebe denúncias por meio deste link.