Vem aí um novo ciclo e, pensando nisso, o artista Clayton David, o Reciclayton, criou o círculo de boas novas que está na capa do Jornal ND. A arte, desenhada na praia da Galheta, é uma das 70 que Reciclayton desenvolveu no litoral brasileiro, incluindo Florianópolis. “A praia é meu caderno de desenho”, brinca o artista que começou com os murais gigantes em 2012, na Ilha Comprida, Sul de São Paulo. E o maquinário é modesto: cordas para ajudar na orientação espacial e um rastelo.

“Feliz novo ciclo! Estamos fechando esse ciclo, que foi de muito aprendizado e muita conexão. A pandemia trouxe novos costumes e informações, novos cuidados com a nossa saúde e a das pessoas. Então, esse trabalho retrata isso, a harmonização entre o ser humano e a vivência com o meio ambiente, essa reconexão e renascimento. Um novo ciclo”, diz Reciclayton olhando para mais uma obra concluída.
A arte na Galheta ficou com 50 metros de diâmetro e foi desenhada a quatro mãos. Clayton teve a ajuda de uma nova amiga, Vanessa Claro, que se impressionou com o trabalho anterior do artista, também na Galheta.

Convidada para ajudar no desenho que seria produzido na manhã seguinte, ela não titubeou. Melhor para o Clayton, afinal, o trabalho exige boas horas de dedicação. Em média, ele demora de uma a cinco horas. Nesta, ele e Vanessa trabalharam por duas horas.
Falando sobre a inspiração para a arte na Galheta, Clayton disse que sempre estuda antes de realizar novos trabalhos. “A Ilha é um lugar que ou por vários ciclos. Colonizadores, piratas, feiticeiras e, até hoje, viajantes am por aqui. É um lugar que tem novos ciclos, pessoas e acontecimentos”, relata.

E essa arte, assim como outras na areia, serão apagadas pela maré, que faz as vezes de borracha. Clayton não vê problema. “O sentimento é de desapego. Trabalho a favor da maré. Se não tiver sol, não dá pra fazer, se a maré não estiver baixa, também. Tenho que saber o momento para me sincronizar com o tempo da maré”, descreve o artista. Ele considera a maré sua aliada: “Ela não leva meu desenho embora, ela deixa a praia ‘lisa’ para eu fazer o desenho”.
De São Paulo e morando em Florianópolis há oito anos, o artista também fazia grafite antes das artes na praia, mas abandonou esse ofício. “A tinta, além de intoxicar a gente, também intoxica o meio ambiente. Por saber a importância e por trabalhar com educação ambiental, gostei muito dessa arte assim [na areia]. Está muito relacionada com a minha proposta de vida”, completa.
Além de não brigar com a maré e de se adaptar ao clima para trabalhar, o artista faz uma intervenção positiva nos locais que visita. “A Galheta, felizmente, é uma praia bem limpa, não temReciclayton e o rastelo muitos resíduos, mas quando estou fazendo o desenho, também me proponho a coletar resíduos”, conta o artista.
Da indústria para a arte
Antes de mergulhar em arte, Clayton tinha uma vida bem diferente. Formado em engenharia, trabalhava na área industrial em São Paulo. Nessa atividade, desenvolveu conhecimentos em geometria e tridimensionalismo.
“Trabalhava com projetos mecânicos e tridimensionais. Fazia programação para máquinas computadorizadas, mas a arte estava sempre junto comigo. Gostava de pintar telas, de fazer estruturas e, depois, veio o interesse por educação ambiental”, conta o artista.

“Acabei me reciclando também, meu nome vem disso. Trabalho com relógio, com educação ambiental, tentando reciclar as pessoas, trazer novos costumes, cuidados com a natureza. É isso que eu vejo como ciclos”, descreve Clayton.
Refletindo sobre os efeitos sociais da pandemia, Reciclayton acredita que a pressão maior está ando. “Estamos saindo disso. A internet mudou a cultura das pessoas. Elas estão mais ligadas no celular, fazendo coisas só através do celular, então, elas se reciclaram também”, pensa Clayton.

Em 2003, visitando Florianópolis para participar do Fórum Mundial Social, surgiu a vontade de viver para sempre na Ilha da Magia. Mas a mudança só ocorreu mais de dez anos depois. “Vim de Fusca, que era do meu pai. Inclusive, comprei para ele trocando garrafas pets. Fiz pufes com elas, vendi para um cliente e comprei o carro do meu pai”, lembra Clayton.
Deixando uma mensagem para 2022, o artista fala em reconexão e cuidado. Para ele, o último período pode ter sido, sim, de perda e tristeza, mas também de aprendizagem. “É preciso cuidar do outro e se cuidar. Espalhar mais amor, confiança, alegria, carinho. Com as pessoas, mais paciência, menos consumo, mais orgânico!”. Assim seja!