Se depender do posicionamento dos parlamentares catarinenses, a Câmara dos Deputados terá um novo presidente nos próximos dias. Ao alegarem a existência de “provas suficientes” contra o presidente Eduardo Cunha (PMDB-RJ), especialmente a de que ele mentiu ao negar contas no exterior, os deputados analisam a situação como insustentável e usarão a tribuna em defesa da cassação e da renúncia do parlamentar.
Cunha perdeu força e argumento na semana ada, quando documentos enviados pelo Ministério Público da Suíça comprovaram a existência de contas secretas em nome dele no país. Até então, o deputado negava a existência, inclusive em depoimento à I (Comissão Parlamentar de Inquérito) da Petrobras no dia 12 de março. A “mentira desmascarada”, para os demais deputados, resulta em quebra de decoro.
A posição vem do próprio partido de Cunha. Para o deputado Celso Maldaner (PMDB), o envolvimento do presidente em atos de corrupção mancha a história da sigla e da Câmara. Maldaner defende nota pública da bancada peemedebista a favor da cassação e promete usar a tribuna hoje para reforçar o posicionamento. “As instituições estão acima das pessoas. O PMDB tem uma história no país e não pode arranhá-la desta forma. Ele [Cunha] não merece continuar na Câmara”, disparou Maldaner.
O presidente do PMDB catarinense, deputado federal Mauro Mariani, disse ser difícil um posicionamento de bancada, fato que constrangeria a sigla, mas ite que “não tem como defender o indefensável”. “Se formos pesquisar, 90% do Parlamento vai defender o bom trabalho que ele fez, mas não tem como defender quem se apropriou de recursos públicos. A situação dele está insustentável”, alertou Mariani.
Da mesma forma, o deputado Valdir Colatto, que prefere aguardar a reunião da bancada nesta terça-feira, já sinaliza que a situação do presidente “não tem mais volta”.
Petistas e tucanos alinham discursos
O desgaste do presidente da Câmara é tamanho que até mesmo a oposição ao governo defende a renúncia. Até então, a ala se mantinha alinhada a Eduardo Cunha, principal articulador do impeachment da presidente Dilma Rousseff. As falas se alinham ao discurso dos governistas, que sempre criticaram o presidente da Câmara.
Ao deixar clara a defesa pela saída de Dilma, o deputado federal Marco Tebaldi (PSDB) disse que o partido também quer o afastamento dos presidentes da Câmara e do Senado. “Ele [Cunha] mentiu na I e não tem mais condições nem autoridade para permanecer no cargo”, alegou Tebaldi.
Um dos 50 parlamentares que am a representação contra Cunha à Comissão de Ética da Câmara na última semana, o deputado Pedro Uczai (PT) defende a cassação, já que o presidente perdeu a legitimidade para comandar o Legislativo. “Temos um conjunto de evidências mostrando o envolvimento pessoal dele na abertura, manutenção e movimentação de valores em contas bancárias na Suíça, que não foram declaradas as autoridades brasileiras”, justificou.
Comissão de Ética começa a analisar caso
Integrante da Comissão de Ética da Câmara, o deputado Jorginho Mello (PR) alega que há elementos para quebra de decoro parlamentar. “Ele afirmou que não tinha conta nenhuma na Suíça. Ele mentiu e mentir é quebra de decoro”, argumenta o deputado, ao adiantar que a Comissão vai se reunir nesta semana para avaliar o pedido de cassação assinados pelos deputados na última semana. “Já ou da hora de ele renunciar, mas independente da renúncia, defendo a cassação. A Câmara está desbotada, sem brilho e precisa tomar uma atitude”, defendeu.
Para Esperidião Amin (PP), que também defenderá a renúncia de Cunha na tribuna da Câmara nesta semana, a situação como está “desmoraliza” o Legislativo. “Ou ele desmente, ou ele sai. Ou prova que não faz parte desta lambança, ou se afasta do cargo”, alegou. “É de interesse do Legislativo que seu presidente tenha autoridade moral reconhecida”, acrescenta.
Carmen Zanotto (PPS) antecipa que a bancada vai se reunir hoje para discutir o posicionamento, mas adianta não ver outra saída para o presidente. “A situação é crítica e difícil para ele. Cunha deve renunciar, até para facilitar seu direito à defesa”, afirmou.
Já o deputado João Rodrigues (PSD) acha que faltam provas contra Cunha. Ele é o único a não endossar o coro pela renúncia. “São informações extraoficiais, nada material. Há denúncias, mas não condenação”, defendeu. “Se provar o crime, aí sim não tem clima nem mais para ele ser deputado”, ponderou.
Não vou renunciar, diz Cunha
Na primeira entrevista à imprensa após a revelação de documentos mostrando sua ligação com contas secretas no exterior, Eduardo Cunha voltou a dizer ontem que não renunciará ao cargo, que tudo ficará “exatamente do jeito que está”, e criticou o governo Dilma Rousseff, que acusou de protagonizar “o maior escândalo de corrupção do mundo”.
Cunha, um dos políticos contra os quais pesa o maior número de indícios de envolvimento no esquema criminoso investigado pela Operação Lava Jato, rebateu declaração da presidente feita durante viagem ao exterior, quando a petista disse lamentar que as suspeitas de desvio de recursos públicos para contas secretas fora do país envolvam um brasileiro.
Em resposta, o peemedebista afirmou lamentar “que seja com um governo brasileiro o maior escândalo de corrupção do mundo”. “Eu fui eleito pela Casa, aqui só cabe uma maneira de eu sair, é renunciar, e eu não vou renunciar. Aqueles que acham que podem contar com minha renúncia, esqueçam, eu não vou renunciar. Não tem plano A, B, C, D ou E. Qualquer discussão ou especulação que está sendo feita é pura perda de tempo”, definiu Cunha, cujo apoio político tem decaído ante as suspeitas.
Na entrevista, o peemedebista voltou a se negar a dizer se tem ou não contas na Suíça ou comentar qualquer detalhe dos documentos que vieram a público nas investigações, entre eles o uso de seu aporte diplomático para abrir algumas das contas que, até então, ele sempre negou ter. Questionado seguidas vezes sobre isso, ele se limitou a dizer que seus advogados irão se pronunciar no momento.