O ano de 2022 termina sem a votação do projeto de revisão do Plano Diretor, discutido pela população em 14 audiências públicas distritais e analisado pelo Conselho da Cidade.
À frente da diretoria de desenvolvimento urbano da Acif (Associação Empresarial de Florianópolis), o engenheiro civil Rodrigo Vieira vem acompanhando de perto esse processo e fala à coluna sobre o impacto do adiamento para o planejamento urbano municipal.

Havia uma expectativa de votação do Plano Diretor ainda em 2022, mas ficou para o ano que vem. Na sua opinião, qual o impacto desse adiamento para a cidade?
A Acif sempre foi promotora do diálogo e do entendimento. A gente percebe que essa atualização do Plano Diretor está desde 2017 na pauta da cidade, por isso não é uma questão de pressa, já tivemos tempo suficiente de debate na cidade para avançar. A sociedade participou das audiências públicas, os próprios vereadores puderam acompanhar. E agora é a vez da Câmara.
Nós sabemos da prioridade que é o Plano Diretor para a cidade, por isso queremos vê-lo logo em vigência, com as alterações e melhorias necessárias. Por outro lado, não queremos um Plano Diretor qualquer, sem aquilo que vai fazer Florianópolis avançar para uma cidade sustentável com desenvolvimento econômico que traga prosperidade para as pessoas.
Você acompanhou as audiências públicas e a discussão no Conselho da Cidade. Quais os pontos do projeto que podem ser mais benéficos para Florianópolis e por quê?
Se nós tivermos a valorização das multi centralidades, que significa ter o local de trabalho, a oportunidade de emprego próximo de onde as pessoas vivem, sem a exigência de grandes deslocamentos – que hoje é uma característica de Florianópolis – por ser uma cidade muito espalhada, nós teremos um local onde a pessoa vive e trabalha, junto com um bairro acolhedor, onde a pessoa não precisa sair dele para ter tudo ao seu redor.
Sobre a moradia social, queremos uma cidade plural, onde as pessoas tenham condições de adquirir seu imóvel, ou alugar, sem ter que comprometer grande parte da sua vida em torno disso. E que possamos aproximar da cidade as pessoas mais humildes, com moradia digna, de qualidade, com infraestrutura etc. Isso só pode ser feito com incentivos para que a indústria da construção civil tenha capacidade de viabilizar projetos como esses.
A moradia social, que é garantir moradia ível para pessoas de todas as rendas em todas as partes da cidade, só vai se tornar possível se o Plano Diretor prever os incentivos na lei, ou seja, acolher para que as pessoas possam desenvolver esses projetos de maneira eficiente e colocar à disposição dos cidadãos.
A proposta de criação de centralidades, com adensamento, e a possibilidade de aumento de gabarito em algumas áreas são pontos que geram mais discussão. Como analisa essas questões?
A gente tem que tratar o adensamento de uma maneira técnica. Os urbanistas do mundo inteiro sabem que hoje uma cidade para as pessoas ela tem a sua infraestrutura – que é cara – mais concentrada para as pessoas se deslocarem menos, ou seja, pode se ter espaços urbanos mais amplos, mais abertos, com gabaritos com mais inteligência na construção.
Você vê mais concentração de pessoas em menos espaço urbano para que facilite as pessoas viverem em lugares melhores, com mais infraestrutura dando mais espaço para a cidade respirar. Isso não é uma questão de opinião, é uma questão técnica que se deve deixar os urbanistas direcionar, nós ficarmos dando opinião sobre isso é o que gera polêmica e causa prejuízos históricos para a cidade.
Enquanto não permitimos maior adensamento, estamos vendo nossos morros sendo invadidos, vendo ocupações ilegais em diversos pontos da cidade, prejudicando o todo, por uma questão de que se facilite o irregular e impede que o regular crie condições favoráveis para todos viverem num lugar melhor.
Um exemplo disso, em números, é que de 2014 para cá foram 30 mil lotes lançados no cadastro imobiliário da prefeitura e apenas 900 foram de forma regular. Da mesma forma que só no Sul da Ilha, também de 2014 pra cá, a gente teve a incidência de 4.500 unidades clandestinas sendo construídas.
Considerando o cenário atual, as características e as vocações da Capital, o que considera essencial discutir nessa discussão sobre o planejamento urbano e o perfil da cidade?
A cidade vai continuar crescendo porque Florianópolis é uma cidade atrativa, não só para o Brasil mas para o mundo inteiro. Com as novas dinâmicas de trabalho (trabalho híbrido e remoto), temos que compreender qual é a nossa vocação de cidade. Hoje está bem claro que a cidade está estruturada nos eixos econômicos da inovação, tecnologia, da saúde, educação e do bem viver.
Para isso nós temos que ter uma cidade estruturada para este tipo de visão, e o que isso significa? Termos estruturas suficientes nos bairros, pararmos de espalhar a cidade desordenadamente e, ao mesmo tempo, incentivarmos que infraestrutura indispensável de mobilidade seja colocada na cidade como um dos pontos de desenvolvimento dela. Isso só vai ser possível com um novo olhar para o espaço urbano, onde nós temos áreas inteligentes de conservação, e por outro lado, conservar pelo uso e não pelo abandono.
Temos que olhar dentro de um contexto futuro, justamente onde o Plano Diretor pode ser muito mais inteligente e estimular que as pessoas ocupem bem os espaços urbanos. A visão integrada da cidade precisa ser unida entre os líderes, não só dentro de um governo, desse momento com a Câmara de vereadores de hoje e com a Prefeitura de hoje, mas sim, trazer para um nível de governança da cidade, onde o Conselho da Cidade, somado com as entidades empresariais e representativas da sociedade civil organizada, possam sim formar algo mais integrado e inteligente para uma visão de longo prazo, para que independente dos políticos, nós possamos ter uma visão de cidade do futuro sendo construída a cada dia.