Havia um clima de expectativa, tensão e constrangimento nos corredores do Palácio Barriga Verde – sede da Assembleia Legislativa de Santa Catarina – na tarde desta quarta-feira (27). O motivo, a discussão da proposta que pretendia criar uma aposentadoria especial para os deputados estaduais e os servidores públicos comissionados dos poderes, com patrocínio de dinheiro público, que acabou rejeitada por um voto.

Diante da crescente repercussão negativa, o chefe da Casa Civil, Eron Giordani (PSD), almoçou na Alesc para conduzir em nome do governador Carlos Moisés (sem partido) a articulação política junto aos deputados governistas.
Em reunião fechada, Eron orientou os presidentes das três comissões: Milton Hobus (CCJ), Marcos Vieira (Finanças) e Volnei Weber (istração), além do líder do governo, José Milton Scheffer (PP). Tudo isso com o aval do presidente do Legislativo, Mauro de Nadal (MDB).
A estratégia ficou clara durante a reunião tríplice de comissões e em plenário: atribuir à imprensa um erro de interpretação quanto ao projeto. Hobus e Weber cumpriram esse papel.
O primeiro disse que os jornalistas que cobriam o caso não tinham lido a proposta e insinuou que houve “maldade” na abordagem – tudo isso sem citar nomes. Em tom jocoso, Weber disse: “cabeça de ignorante não se lava com sabonete”.

Já Zé Milton focou em ler um texto preparado pelo Executivo para dizer que não havia menção a deputados e comissionados na proposta. A narrativa de que a imprensa jogava a sociedade contra os deputados estaduais foi desfeita dentro do próprio plenário, pelos deputados Sargento Lima (PL) e Luciane Carminatti (PT).
Lima apresentou um voto divergente ao relatório favorável de Valdir Cobalchini (MDB) e classificou o projeto como “aberração”.
Luciane tinha pronto um destaque caso a matéria fosse aprovada. No entendimento da deputada, não é justo que seja aplicado dinheiro público para patrocinar aposentadorias complementares de deputados e comissionados que recebem altos salários.
Clima de otimismo e decepção 84dp
Antes da votação, o líder do governo mostrou otimismo com a aprovação do PLC. “Foi aprovada nas comissões e a tendência é que seja aprovada”, disse Scheffer, horas antes da votação.
A divulgação do resultado no plenário frustrou o líder do governo que olhava pasmo, com ar de incredulidade, que o projeto era rejeitado por causa de um voto.

A cereja do bolo foi o equívoco do chefe do Legislativo, que conduzia a sessão. Geralmente, o presidente da Casa vota apenas em caso de empate. Já com o de votação fechado – e com a proposta derrotada por apenas um voto, Mauro de Nadal tentou garantir o resultado.
Por ser um projeto de lei complementar, a aprovação dependia de maioria simples, ou seja, 21 dos 40 votos. O deputado João Amin (PP) reagiu e Nadal itiu que estava infringindo a legalidade regimental.
“A votação já tinha sido encerrada. Na CCJ houve algo parecido e não autorizaram o deputado a votar novamente e ele teve que ratificar o voto, mas ratificar o voto não muda o placar. Que bom que o regimento foi respeitado, o próprio presidente itiu”, contou Amin.
O gesto de Nadal, de não votar, era o termômetro da confiança que o Executivo tinha que a base governista fosse garantir a proposta, mesmo diante da escalada de críticas.
Segundo João Amin, o governo se apegou na confiança de outras votações na Casa, no qual conseguiu ampla maioria, porém no caso do PLC ficou a dúvida, para parte dos parlamentares, da possibilidade do deputado se aposentar ou não na função.
“Ninguém é deputado, a gente estar deputado, não seria justo depois de décadas que foi extinta a antiga aposentadoria dos parlamentares e isso voltar agora. A população não aceitaria”, comentou João Amin.
Imprensa e órgãos fiscalizadores 4h6d31
O outro recado é a função essencial da imprensa para o fortalecimento da democracia e da cidadania. Não fosse o alerta dos veículos de comunicação – em especial o Grupo ND, que se posicionou de maneira firme, além de ampla cobertura com reportagens – a proposta certamente seria aprovada, visto que tramitava de forma rápida e silenciosa.

“Que bom que os órgãos fiscalizadores, a imprensa, as entidades de classe, até a OAB se manifestou contrário. Obviamente isso influenciou a votação”, afirmou João Amin.
A decepção estava expressa no rosto do líder do governo na Alesc logo após a votação. A base governista contava com 23 votos para garantir a aprovação do projeto, mas ausências de parlamentares, entre elas do deputado Maurício Eskudlark (PL), na votação fizeram ruir a esperança dos governistas. Apesar de contar com o voto dele, na última terça-feira (26), o parlamentar publicou em uma rede social ser contrário ao projeto .
View this post on Instagram
“Agora tem que ser feita uma avaliação. É lamentável, o governo cumpriu com o compromisso dele, enviou o projeto para a Alesc. A Casa por um voto deixou de aprovar o projeto, que era bastante avançado, que ia fazer justiça a um grande grupo de funcionários públicos não só do Executivo, mas também de outros poderes”, comentou Scheffer.
O líder do governo informou que o momento será de rediscutir e debater o tema com as categorias e novamente com o Executivo. Como o projeto foi rejeitado, pelo regimento da Casa, ele só poderá retornar à discussão na Alesc apenas no próximo ano.
De acordo com fontes ouvidas na Alesc, o Ministério Público e o Tribunal de Justiça já teriam se manifestado contrários a oferecer uma previdência complementar aos comissionados desses órgãos. “O MP não iria instituir”, disse um deputado.